Após a publicação da nova reforma previdenciária, confira como ficam os direitos da população transgênero
Por Carla Benedetti
Assumidamente feminista e lutadora dos direitos sociais e humanos, batalho há anos pela defesa de políticas públicas para mulheres. No dia 12 de novembro de 2019, foi aprovada a reforma da previdência. Ainda que a idade da mulher, para a aposentadoria por idade, tenha sido alterada para 62 anos, e a do homem permanecido em 65 anos, entende-se que pelo fato de a mulher desempenhar dupla jornada e ter maior dificuldade para entrar no mercado de trabalho e verter contribuições ao INSS, deve-se aposentar mais cedo.
O questionamento ainda mais polêmico e difícil de ser debatido é em relação à aposentadoria da pessoa transexual: como conciliar a mudança de gênero com a idade e tempo de contribuição para a aposentadoria? No que concerne às implicações do direito previdenciário para os direitos dos transexuais, a resposta, quanto à aplicação da idade e do tempo de contribuição para garantia da aposentadoria, não se mostra fácil de ser equacionada.
O Supremo Tribunal Federal tem firmado o entendimento de que, uma vez alterado o gênero em Certidão de nascimento, independente de cirurgia de mudança de sexo, o gênero a ser considerado é aquele que consta em Certidão no momento do requerimento da aposentadoria. Para o homem que se torna mulher, como ocorre na maioria dos casos, haveria uma vantagem, visto que tanto a idade como o tempo de contribuição exigidos para as mulheres são menores do que os homens. Recentemente, o Diário Oficial do Tribunal de Contas de Santa Catarina também publicou uma decisão favorável a respeito da aposentadoria de uma servidora da prefeitura de Itajaí, que fez a transição de gênero do sexo masculino para o feminino. A servidora, que é uma médica da prefeitura, pediu que as regras seguissem os critérios para mulheres.
Todavia, e se o caso for a mudança de sexo de mulher para homem? Como proceder?
No caso da mudança de sexo de mulher para homem, poderia se dizer que haveria uma agravante, pois, uma vez considerada a lógica aplicada à mulher, tal pessoa deveria cumprir mais tempo para possuir direito à aposentadoria? Também não há um consenso sobre este assunto, no entanto, os transexuais são intensamente segregados da comunidade e, portanto, também possuiriam grandes dificuldades de desenvolvimento social e profissional.
Os grupos vulneráveis, dentro de uma política de Seguridade Social e de garantia de manutenção de um Estado de bem-estar social, são protegidos de forma diferenciada, assim como trata o art. 201, δ 1°, incisos I e II, da CF, que assegura tratamento diferenciado às pessoas com deficiência e aos trabalhadores que exercem suas atividades em condições insalubres e/ ou periculosas, e que causam, portanto, prejuízo à saúde e integridade física.
Sobre o assunto, o então Ministro Celso de Mello deu parecer favorável aos transexuais, quanto à mudança de sexo, ao tratar que “de nada adianta superar esse impasse – a dicotomia entre a realidade morfológica e a psíquica – se a pessoa continua vivendo o constrangimento de se apresentar como portadora do sexo oposto”, e cabe aos intérpretes do direito, como operadores de transformação social,
promover uma mudança positiva também no direito previdenciário, a fim de assegurar a estas pessoas um tratamento diferenciado que venha a garantir a dignidade da pessoa humana: indicador mais idôneo de uma civilização evoluída e com sedimentação nos direitos sociais conquistados.
ARTIGO PUBLICADO NA REVISTA BE FREE MAG/ MAR 24. ACESSE ABAIXO:
https://befreemag.com.br/wp-content/uploads/2024/04/BFMag_ED-5_marco-2024.pdf